Anos atrás, no início da minha adolescência, tive um papo com um amigo que me lembro muito bem. Falávamos animadamente sobre como poderíamos ficar fortões e conquistar muitas meninas por isso. Mais precisamente, falei que meu pai era fortão, musculoso e que provavelmente eu também seria. Passado algum tempo, este amigo conheceu o meu pai e depois me questionou 'Aquele era o seu pai? Você não disse que ele era fortão?'. 'Como assim?' - pensei eu - 'Meu pai é fortão, sim!'
Esta semana meu pai não está bem de saúde. Tem sentindo algumas dores e mal tem conseguido ir ao trabalho. Hoje, quando nenhum dos seus 5 filhos puderam acompanha-lo ao hospital, pedi dispensa no trabalho e fui. Na volta de ônibus, morto de cansaço, deitei-me em seu ombro e comecei a me lembrar de muita coisa.
Eu não fui o filho favorito do meu pai (sei que todos dizem que não há favoritos, mas desconfio seriamente disto). No caso do meu pai, não era preciso ir muito longe para perceber a armação. Eu, que herdei o nome de um grande ídolo do futebol, não herdei o talento e nem o interesse pelo esporte. Eu me refugiava em livros. Enquanto sobrou pro meu irmão a tarefa de ser o ídolo da seleção e a esperança de tirar a família da pobreza.
Lembrei-me de um dos dias mais tristes da minha vida quando, aos 6 anos, fomos despejados da casa em que morávamos por não termos condições de pagar o aluguel. Meu pai, desempregado, conseguiu uma casa em construção de um amigo e nos mudamos para lá. Casa muito engraçada que não tinha teto, não tinha nada. Literalmente.
Lembrei-me do jingle que tocava, todos os dias, no radinho de pilha dele. 'Rádio Globo: música, esporte e notícia', às 4 da manhã, quando ele saia para uma dura jornada de trabalho, mas não sem antes preparar o café para a família. (E, até hoje, onde ele está, tem um radinho ao lado).
Lembrei-me de certa vez quando peguei catapora. Ele me disse que se eu sarasse me daria um pacote de biscoito recheado inteiro para eu comer. Eu sarei, mas não havia dinheiro para o pacote de biscoitos.
Lembrei-me de, como todos os domingos, ele me acordava para ir a missa. Algumas vezes eu fingia dor de barriga, nas outras dor de cabeça. A maioria, não conseguia escapar.
Lembrei-me de como, todos os anos no dia das crianças, ele nos levava ao Parque do Carmo ou a Aparecida do norte. Era o dia mais feliz do ano! A família inteira junta, levando refrigerante e lanches nas mochilas, vivendo um dia tão aguardado. Só não menos esperado do que a unica vez em que ganhávamos brinquedos, no final do ano, uma cortesia que a empresa dava aos filhos dos funcionários.
Lembrei-me de como, no ano retrasado, dei a ele uma Havaianas toda estilosa de presente de natal e quando perguntei porque ele não usava, me respondeu: 'Só vou usar em ocasiões especiais'.
E lembrei de muitas, muitas outras coisas.
Recostado em seu ombro percebi o quanto estou mais alto que ele, mais gordo e até mesmo mais forte que o senhorzinho de 63 anos que, de segunda à sexta, levanta pela madrugada para ir a outra cidade embalar latas de tinta, carregar caminhões, pegar peso recebendo um salário que é quase 3 vezes inferior ao meu. Percebi como ele ficou feliz por eu ter ido acompanha-lo. Como, mesmo sem nunca ter dito, ele se orgulha do filho que me tornei. Como se interessa pelo meu trabalho (por mais que nunca entenda o que eu faço), pelos meus estudos, pelos meus projetos pessoais. Percebi como tenho orgulho deste cara que, mesmo 'não tendo nada', nunca deixou nada faltar aos filhos.
Recostado em seu ombro percebi o quanto estou mais alto que ele, mais gordo e até mesmo mais forte que o senhorzinho de 63 anos que, de segunda à sexta, levanta pela madrugada para ir a outra cidade embalar latas de tinta, carregar caminhões, pegar peso recebendo um salário que é quase 3 vezes inferior ao meu. Percebi como ele ficou feliz por eu ter ido acompanha-lo. Como, mesmo sem nunca ter dito, ele se orgulha do filho que me tornei. Como se interessa pelo meu trabalho (por mais que nunca entenda o que eu faço), pelos meus estudos, pelos meus projetos pessoais. Percebi como tenho orgulho deste cara que, mesmo 'não tendo nada', nunca deixou nada faltar aos filhos.
Meu único desejo hoje foi reencontrar aquele amigo e dizer, com toda a certeza do mundo: Meu pai não é apenas um fortão... ele é o homem mais forte do mundo!
Em lágrimas,
Em lágrimas,
Josimar